Há um cansaço em mim. Em nós. Fruto de suprema vergonha ao ver o país se converter, a cada dia, em local onde a selvageria prevalece, a má educação campeia, os horrores se espalham e as instituições derretem.

Sob este nosso céu claro, a violência está em toda parte. Naturalizou-se. Instalou-se sem cerimônia nas salas e escolas, nos tribunais e nas igrejas. Já não é feita apenas de balas, mas também de gestos e falas corrompidos.

Das redes sociais ao plenário da mais alta Corte do país, tornamo-nos uns destemperados, reféns de boçalidades, adeptos do grito.

Os supostos detentores da razão não se refreiam. Perante o sofrimento e a morte não se intimidam. Aderem sem pensar duas vezes às frases de efeito e aos clichês minúsculos. Infelizes que não aceitam o debate, que empurram goela abaixo dos opositores frases baratas, argumentos frágeis, baixezas mil.

Há uma vocação autoritária a nos assombrar. Um ódio mal contido, que desperta à menor provocação. Uma vontade de calar o outro. O diálogo? Resta afogado num mar de impropérios, pois nesta pobre terra ninguém mais admite ser contrariado. O outro é sempre o problema.

Vejo como muitos se riem, deliciados, quando surge alguém para berrar supostas verdades na face do adversário. “Mitou! Lacrou! Arrasou!” – ecoam as redes sociais, regozijadas pela vingança que brota da boca alheia, insufladas por gente especialista em cevar ódios.

É com espanto que nos flagramos cansados, abatidos, sonhando em abandonar a terra generosa onde nascemos. Desejamos reiniciar a vida em bases menos encharcadas dessa raiva onipresente, dessa falta de polidez e de civilidade. E, no entanto, somos parte do problema.
Honestidade, equilíbrio, moderação, honra e dever deveriam estar no altar doméstico e da coletividade. Não estão. O que condena a corrupção muitas vezes também se locupleta. O que louva a elegância apela para grosserias. O criminoso veste o manto da honestidade, sob o aplauso de seus seguidores.

Às favas a coerência, a dignidade, as virtudes.

Virtudes, virtudes – onde estão? Não aqui. Não agora.

Em seu soneto 94, Shakespeare fala de flores que, se contaminadas em sua essência, serão menos dignas que a erva daninha. É que o mais doce se torna o mais amargo por causa de seus atos; e os lírios que apodrecem fedem muito mais que as ervas daninhas.

Estamos rotos – isto é certo. Lírios embrutecidos, contaminados, sem consciência e empatia, sem educação, flertando com o abismo.

Agonizamos. O olho do tempo nos espia. E sua lágrima solitária traduz a indagação: que força nos salvará de nós mesmos?

Basta, senhores. Basta.